Campo Grande está entre as cidades onde suposto esquema de fraude em licitações de ônibus era operado há anos. Documentos aos quais o G1 teve acesso revelam que o engenheiro Garrone Reck e parentes tinham influência nas licitações em pelo menos 19 cidades do Brasil.
Na Capital assim como em outros municípios, segundo a documentação que motivou até operação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) de Londrina (PR) – que prendeu o engenheiro Garrone Rech e sócios dele em junho deste ano – o grupo também comandava a empresa Logitrans, que era contratada para fazer o projeto de mobilidade urbana que antecede a licitação.
A empresa elaborava toda a documentação que privilegiava duas famílias a Gulin e Constantino, essa segunda que vence as concorrências em Campo Grande nas últimas décadas e é responsável pelas viações Cidades Morena, São Francisco, Jaguar e Campo Grande, e que desde 2012 integram o Consórcio Guaicurus.
A concessão para exploração do transporte coletivo em Campo Grande lançada em 1998 venceria no ano de 2014, mas teve o processo de concorrência para renovação antecipado pela gestão do então prefeito Nelson Trad Filho (ex-PMDB e atual PTB).
O processo para a nova concessão começou a ser feito em 2009, com a elaboração do Plano Diretor de Transporte e Mobilidade Urbana da Capital, que justamente foi feito pela empresa Logitrans. O Consórcio Guaicurus, da família Constantino, venceu a concorrência em outubro de 2012. A licitação foi avaliada em R$ 3,4 bilhões e a concessão é válida por 20 anos.
Conforme a apuração do G1, quatro meses antes do edital de licitação ser aberto, Sacha Reck e Danielle Cintra, do escritório Guilherme Gonçalves & Advogados Associados, do qual Reck era sócio, discutem, por e-mail, a formação do consórcio que venceria a disputa.
Danielle escreve: “Estou iniciando o trabalho. Sobre a questão de se tratar de um evento ‘futuro’, tenho algumas ressalvas: Ao fazer um compromisso de constituição de consórcio, creio que partimos do pressuposto de que sabemos de antemão que o futuro Edital permitirá a participação em consórcio, o que causaria estranheza já que essa não é a realidade atual. Conceituamos “contrato de concessão”; licitação; “objeto da licitação”, o que também gera uma sensação de que temos conhecimento. Fazemos várias referências ao “Edital”; descrevemos participação no lote”.
Para viabilizar a licitação em Campo Grande, Sacha Reck e os empresários discutem uma forma de que o contrato da prefeitura com a Viação Cidade Morena, que explorava o transporte na cidade desde 1998 e que dá direito à concessão até 2014, fosse cancelado.
OUTRO LADO
Ao Portal Correio do Estado, o ex-prefeito Nelson Trad Filho afirmou que a denúncia tem cunho eleitoreiro porque surgiu às vésperas das convenções partidárias. Segundo ele, todo o processo licitatório para a concessão do transporte público de Campo Grande ocorreu de forma legal e não houve esquema ou fraude.
“A concessão vencia em 2014, mas eu chamei equipe jurídica e pedi estudo para saber como eu poderia fazer para antecipar porque havia recursos federais que poderíamos usar. Foi proposto pela minha equipe jurídica formalização de um TAC [Termo de Ajustamento de Conduta] para a rescisão do contrato atual e nova concessão”, disse Nelsinho.
Ainda segundo o ex-prefeito, o edital de licitação não foi feito por integrantes do esquema e foram praticamente três anos para que tudo ficasse pronto. “Deixamos o edital 45 dias disponível para consulta da população e o parecer do Ministério Público diz que não houve fraude ou direcionamento”, afirmou.
A reportagem tentou contato com o diretor do Consórcio Guaicurus, João Rezende, mas nenhuma ligação foi atendida até o fechamento desta matéria.